06 agosto 2009

resenha sobre a antologia "XXI Poetas de hoje em dia(nte)" no Estado de Minas

Tribo dos sensíveis

XXI Poetas de hoje em dia(nte) reúne escritores que encontraram na internet ponto de partida para corajosas incursões literárias

Por André di Bernardi Batista Mendes


A Editora Letras Contemporâneas acaba de lançar o coletânea XXI poetas de hoje em dia(nte). Organizada por Aline Gallina e Priscila Lopes, o livro reúne escritores que utilizam principalmente a internet para divulgar seus trabalhos e textos literários. Trata-se de um belíssimo e interessante apanhado de bons artistas – alguns com obras publicadas no formato usual, outros completamente inéditos. São os praticantes da chamada e-poesia.

A internet é uma terra de ninguém. Mas, paradoxalmente, pode ser de todos. O mundo dá voltas, as curvas são inevitáveis e a região luminosa desses poetas abrange um largo território que extrapola vários limites. Vejo sinceridade, existem belíssimos textos na coletânea.

Entre boas surpresas, como Estrela Ruiz, filha de ninguém menos que Paulo Leminski, encontra-se outras promissoras vozes, como a dos mineiros Mônica de Aquino – uma das melhores poetas do livro – e Ronaldo Werneck e dos cariocas Victor Paes e Karinna Gulias. Autor do livro O óbvio dos sábios, Victor, sem pressa nenhuma, como um menino levado, ensina que é sempre possível resumir a luminosidade extrema de um poema, de um verso. Dizendo o mínimo, ele clareia o máximo. Trata-se, ao lado de Karinna, Mônica e Ronaldo, de poeta que já está pronto, que brincaria fácil na lista dos melhores escritores da nova geração.

Contudo, não se aplica o superlativo para definir muitos dos textos escolhidos do livro, é bom que se diga, mas o que transcende e o que realmente importa é que, ainda hoje, existem, resistem os poetas e a poesia, seja na rede mundial de computadores, seja no livro, que ora se torna, mal comparando, uma loja de brinquedos. Wilson Guanais encanta com a simplicidade de um raio: “Um dia/ eu quebro/ o inquebrável// : a casca/ do indizível”; e fulmina sem azáfama: “Sou poeta/ de um poema/ inacabado// : ainda/espero/ o inesperado”. Caixa de descobertas. Caixa escura. Toda poema é filho do mistério: “Quero/ apenas/ que/ o poema/ exista// e/ funcione/ um/ instante// se/ possível// que/ não/ o/ decifrem”.

Garimpo. Trabalho. Pérolas e diamantes. Panoramas. Batuques de várias tribos. Faróis. Com Poetas de hoje em dia(nte), Priscila Lopes e Aline Gallina forjaram forças e ampliaram 21 cantos para atualizar o sentimento de um pedaço de época. O primitivo som de diversas vozes. Poesias, poetas em trânsito, transidos de forças e palavras.

Aline Gallina, que, como Priscila Lopes, participa do livro, nasceu em Florianópolis, cursa artes plásticas e arquitetura e urbanismo e trabalha nas oficinas de arte da Fundação Catarinense de Cultura. Administra os blogs Cinco espinhos e ponto-e-vírgula. É dela o belíssimo poema “Tolerância”: “Sou de família azul/ parida pelo sul da vida/ Claro que não herdei/ a tolerância do silêncio// Minha mãe tem três filhos/ no futuro oco do espaço/ Meu ovo quebrou duas vezes/ antes de eu trazer eterna(mente)/ a tola herança da noite”.

Priscila Lopes, nascida em Brasília, é graduada em relações internacionais e cursa MBA em comércio exterior. Possui contos, crônicas e poemas publicados em antologias. Administra o blog Cinco espinhos e colabora com outros dois: Sindicato dos escritores baratos e Miniminimos. Dona de uma poesia singular, forte, é dela o poema “Corpo mole”: “Estamos fracos, sim quebramos/ frascos/ de perfumes baratos/ Carros demais/ atravessam a luz do dia/ Estamos na avenida sem ver/ o carnaval passar sem sambar/ o samba do crioulo/ doidos varridos/ porta à fora do sucesso (...)”.


Resenha publicada no Estado de Minas em 04.07.2009

Um comentário:

VICTOR COLONNA disse...

Olá Victor,
Tudo bem? Sou poeta e cronista e em breve vou lançar meu segundo livro de Poesia, "Cabeça, Tronco e Versos". Tenho um blog, onde divulgo meus trabalhos. Linkei você lá. Se puder, dê uma olhada. Se gostar, pode me linkar aqui também (rs). Seguem aí um poema e um crônica. Grande abraço,
Colonna


SUJEITO OCULTO (Victor Colonna)



O problema são as conjunções desconjuntadas
As interjeições rejeitadas
Os adjetivos desajeitados
Os substantivos sem substância
As relações de deselegância entre as palavras.

É preciso superar o superlativo:
O absoluto sintético
E o analítico.
Achar o verso
Entre o verbo epilético
E o pronome sifilítico.

Falta definir o artigo inoxidável
O numeral incontável, impagável.

Resta procurar o objeto direto
Situar o particípio passado
E o pretérito mais-que-perfeito

Desvendar a rima
Desnudar a palavra
Encontrar o predicado
E revelar o sujeito.



EU E MEU PAI (Victor Colonna)


Hoje me lembrei de uma noite passada há muitos anos.
Meu pai e eu estávamos na casa de sua terceira mulher, na Urca, (papai tinha essa coisa meio Elizabeth Taylor, casou várias vezes, algumas com a mesma mulher). Era madrugada e bateu uma vontade louca de comer uma pizza. Fui então escalado pra comprar uma pizza de alho no Garota da Urca, distante alguns quarteirões da casa.
Ao voltar, pizza na mão, entrei numa rua absolutamente deserta. Uma brisa leve balançava as árvores, um cachorro latia ao longe, o cheiro da pizza, eu com 15 anos e de repente, a pizza era minha, a rua era minha, o pai era meu, eu tinha 15 anos e o mundo era meu . E era lindo!
Saudade daquela pizza, daquela brisa, dos meus 15 anos , da felicidade inesperada ao me sentir o dono da rua, e sobretudo, saudade eterna do meu pai.